A Autoeficácia no Contexto do Planejamento de Carreira
- Clauber de Andrade
- 29 de jun.
- 7 min de leitura

Resumo
A autoeficácia é uma crença importante e que guarda relação direta com a nossa capacidade de realizar uma atividade, ou, principalmente uma nova atividade. No contexto do planejamento ou transição de carreira, o fortalecimento desta crença torna-se ainda mais importante e pode se tornar um diferencial entre o sucesso ou não neste processo. Neste artigo, vou tratar das principais características da autoeficácia, as fontes de desenvolvimento dessa crença, e, principalmente, como ela se torna um fator-chave para enfrentar transições profissionais em qualquer etapa da jornada. Ao final, oferecerei caminhos práticos para quem deseja fortalecer essa competência essencial à adaptabilidade e ao crescimento profissional.
1. Introdução
Diante da dinâmica dos dias de hoje, mudar de carreira e realizar transições profissionais já não é mais exceção. Ao contrário, além de um movimento de cada vez mais é natural, chega a ser necessário em determinados momentos da vida.
Como já comentei em artigos anteriores (Planejamento de Carreira: Um Guia sobre Como Conduzir um Processo de Transição de Carreira), essas transições podem ser motivadas por fatores diversos: o desejo de crescimento, necessidade em razão de um desligamento, reestruturações organizacionais ou, simplesmente, a vontade de trilhar novos caminhos diante de um mundo em constante transformação.
Em qualquer desses cenários, um aspecto é comum: toda transição exige mais do que planejamento técnico — ela demanda enfrentamento da incerteza, eventualmente até mesmo medo, tomada de decisão consciente e capacidade de ação diante de situações inéditas. É aí que entra um fator psicológico determinante para o sucesso deste processo: a autoeficácia.
Mais do que otimismo ou autoconfiança genérica, a autoeficácia refere-se à crença específica de que somos capazes de realizar com êxito aquilo que nos propomos a fazer — mesmo quando o cenário é novo, incerto ou desafiador. Trata-se de um elemento silencioso, mas essencial para transformar intenção em ação.
Sem essa crença, mesmo o melhor plano de carreira corre o risco de ficar paralisado no papel. Com ela, nós podemos enfrentar o desconhecido com mais foco, perseverança e adaptabilidade — habilidades cada vez mais valorizadas em um mundo onde mudar não é sinal de fraqueza, mas de maturidade e visão estratégica - como explorei no artigo sobre adaptabilidade nas carreiras contemporâneas (Carreiras Contemporâneas: Adaptabilidade como Chave para o Sucesso).
2. O que é autoeficácia?
O conceito de autoeficácia foi desenvolvido pelo psicólogo Albert Bandura, como parte da Teoria Social Cognitiva. Para ele, autoeficácia refere-se à convicção que um indivíduo tem sobre sua capacidade de organizar e executar ações necessárias para atingir determinados objetivos.
“A autoeficácia influencia as escolhas que as pessoas fazem, o esforço que despendem, o quanto persistem diante de obstáculos e o quanto se recuperam após fracassos.” (Bandura, 1997)
É importante esclarecer que a autoeficácia não é uma competência técnica nem um traço fixo de personalidade. Trata-se de uma crença psicológica situacional e dinâmica, que regula o comportamento e a motivação diante de tarefas específicas. Por isso, ela pode variar entre diferentes áreas da vida e do trabalho, sendo moldada por experiências anteriores, contextos sociais e fatores emocionais.
Essa crença atua como um filtro que molda a forma como interpretamos os desafios, as oportunidades e até os próprios erros. Um profissional com alta autoeficácia tende a ver situações complexas como desafios a serem superados, enquanto alguém com baixa autoeficácia pode desistir antes mesmo de tentar.
A autoeficácia não é inata. Ela se constrói ao longo do tempo e pode ser desenvolvida de maneira intencional. Uma pessoa pode, por exemplo, ter alta autoeficácia em liderança de equipes, mas baixa autoeficácia ao falar em público ou empreender.
Em seguida, veremos como essa crença é formada e o que pode fortalecê-la ou enfraquecê-la ao longo da jornada profissional.
3. As fontes da autoeficácia
Segundo Bandura (1997), existem quatro fontes principais que contribuem para o desenvolvimento (ou enfraquecimento) da autoeficácia. Compreendê-las é essencial para quem deseja fortalecer essa crença e aumentar sua capacidade de agir com confiança diante dos desafios profissionais.
Experiências de domínio (Mastery Experiences)
Nada fortalece mais a autoeficácia do que viver experiências de sucesso. Quando realizamos uma tarefa com êxito, passamos a acreditar que somos capazes de repetir esse desempenho em situações semelhantes. Por isso, reconhecer e valorizar conquistas anteriores — mesmo que pequenas — é um passo importante para construir confiança.
Experiências vicárias (Vicarious Experiences)
Observar outras pessoas em situações semelhantes, especialmente quando essas pessoas superam desafios com sucesso, pode reforçar a nossa própria crença de que também somos capazes. É o famoso “se ela conseguiu, eu também posso”. Histórias inspiradoras, referências positivas e a convivência com mentores desempenham papel importante nesse processo.
Persuasão social (Social Persuasion)
O encorajamento verbal de pessoas em quem confiamos — como líderes, colegas, amigos ou familiares — pode influenciar positivamente nossa autoeficácia. O simples ato de alguém dizer “eu acredito em você” pode gerar o impulso necessário para enfrentarmos uma situação nova com mais segurança.
Estados fisiológicos e emocionais (Physiological and Affective States)
Nossas emoções e sensações físicas também interferem na percepção de autoeficácia. Emoções como ansiedade, medo ou fadiga podem minar a confiança, enquanto sentimentos de entusiasmo, calma ou energia favorecem uma percepção mais positiva de si mesmo. Aprender a reconhecer e regular esses estados é parte importante do desenvolvimento pessoal e profissional.
Ao fortalecer essas quatro dimensões, o profissional constrói uma base mais sólida para enfrentar incertezas, assumir riscos calculados e se adaptar a novos contextos — capacidades indispensáveis no planejamento e na transição de carreira.
4. O que dizem as pesquisas sobre autoeficácia e carreira
A influência da autoeficácia no comportamento profissional vai muito além de uma percepção subjetiva. Diversos estudos científicos já demonstraram que essa crença tem efeitos concretos sobre desempenho, tomada de decisão e adaptação a contextos desafiadores.
Uma das evidências mais robustas é um estudo conduzido por Stajkovic e Luthans (1998), que reuniu dados de 114 estudos com mais de 21 mil participantes. Os autores identificaram uma correlação significativa entre autoeficácia e desempenho no trabalho — mais forte, inclusive, do que a encontrada com variáveis como inteligência ou experiência.
O estudo também revelou que essa relação é mais intensa em tarefas de menor complexidade e em ambientes simulados, mas permanece relevante mesmo em cenários reais e desafiadores.
Complementando esse panorama, a Teoria Social Cognitiva da Carreira, proposta por Lent, Brown e Hackett (2002), evidenciou o papel central da autoeficácia em todo o processo de desenvolvimento profissional. Segundo os autores, essa crença influencia diretamente:
A escolha de carreira;
A definição de objetivos;
A persistência diante de obstáculos;
E a capacidade de adaptação em cenários de mudança.
Esses achados reforçam que a autoeficácia não é apenas um componente psicológico secundário, mas sim um preditor relevante de ação, desempenho e sucesso em trajetórias profissionais. Entender seu funcionamento — e, sobretudo, como desenvolvê-la — torna-se, portanto, um diferencial estratégico para quem busca conduzir com mais segurança e intencionalidade a própria carreira.
5. Como fortalecer a autoeficácia no planejamento de carreira
As transições de carreira, como discutido anteriormente, são momentos desafiadores que envolvem incertezas, questionamentos e exposição a situações desconhecidas. É natural que surjam dúvidas: será que estou fazendo a escolha certa? Tenho capacidade para aprender algo novo? O mercado me reconhecerá nessa nova função?
Nessas circunstâncias, a autoeficácia se revela um dos fatores psicológicos mais determinantes. Profissionais com altos níveis dessa crença tendem a enfrentar tais momentos com mais coragem, foco e resiliência. Eles não ignoram os riscos, mas confiam na própria capacidade de superá-los, o que os leva a agir com intencionalidade, buscar apoio, investir em capacitação e experimentar novas possibilidades com mais segurança.
Fortalecer essa crença, portanto, é uma estratégia essencial para ampliar a autonomia, destravar decisões e conduzir a carreira com mais consciência e protagonismo.
Mas como desenvolver a autoeficácia?
A boa notícia é que essa crença não é fixa — ela pode ser fortalecida de forma prática e intencional ao longo do tempo. Elenco aqui algumas algumas orientações validadas tanto pela teoria quanto pela experiência prática:
Reconheça suas conquistas anteriores
Crie um inventário das experiências bem-sucedidas — mesmo que pequenas. Relembrar e valorizar o que já foi conquistado reforça a percepção de capacidade e competência.
Busque exemplos positivos de transição: Inspire-se em trajetórias reais de pessoas que mudaram de área, função ou propósito. O contato com histórias de superação fortalece a crença de que você também é capaz.
Aproxime-se de mentores e redes de apoio: O encorajamento certo, vindo de pessoas confiáveis, pode ser decisivo. Mentores, líderes e amigos são fontes valiosas de persuasão social.
Invista no aprendizado contínuo: A atualização constante de conhecimentos e habilidades técnicas reforça a sensação de preparo e reduz a insegurança diante de novos desafios.
Cuide da sua saúde emocional e física: Emoções como ansiedade e desânimo impactam diretamente na autoconfiança. Práticas como meditação, atividade física e descanso adequado ajudam a manter estados emocionais positivos.
Adote um mindset de crescimento: Encare os erros como parte do processo de evolução — não como sinal de incapacidade. Aprender com as falhas é um diferencial nos caminhos de reinvenção profissional.
Ao investir no fortalecimento da autoeficácia, o profissional não apenas melhora seu desempenho — ele amplia seu campo de possibilidades. E, diante de um mercado que valoriza cada vez mais a adaptabilidade, essa pode ser uma das principais alavancas para conduzir mudanças com mais autonomia e sucesso.
6. Conclusão
A autoeficácia é uma crença silenciosa, mas profundamente transformadora. Mais do que uma percepção otimista, ela funciona como um regulador interno das escolhas, comportamentos e resultados profissionais — especialmente em momentos de mudança.
Como fundamentei ao longo deste artigo, essa crença influencia diretamente a forma como as pessoas tomam decisões, definem objetivos, persistem diante de obstáculos e se adaptam a novos contextos. Evidências científicas robustas demonstram que a autoeficácia tem impacto significativo sobre o desempenho e o desenvolvimento de carreira, superando, em muitos casos, fatores como experiência prévia ou inteligência.
Nos processos de transição — seja por escolha ou necessidade — a autoeficácia se torna um diferencial. É ela que sustenta a confiança para enfrentar o desconhecido, buscar caminhos alternativos e transformar incertezas em aprendizado. Profissionais que acreditam na própria capacidade tendem a agir com mais foco, a buscar apoio de forma proativa e a construir soluções mesmo em cenários adversos.
O mais relevante é que essa crença pode ser desenvolvida. A partir do reconhecimento de experiências anteriores, da inspiração em trajetórias positivas, do apoio social, do aprendizado contínuo e do cuidado com a saúde emocional, é possível fortalecer a autoeficácia de maneira prática e sustentável.
No planejamento de carreira, não basta traçar metas. É preciso cultivar a convicção de que se é capaz de alcançá-las. E é justamente essa convicção — consciente, construída e fortalecida — que pode fazer a diferença entre permanecer no lugar ou dar o próximo passo com clareza, coragem e direção.
E você? Agora que conheceu um pouco mais sobre este importante crença, está pronta para fortalecer – sua forma consciente e intencional – a sua autoeficácia no contexto de seus desafios profissionais e de desenvolvimento, principalmente na gestão de sua carreira?
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Referências Bibliográficas
BANDURA, Albert. Self-efficacy: The Exercise of Control. New York: W. H. Freeman, 1997.
LENT, R. W.; BROWN, S. D.; HACKETT, G. Social cognitive career theory. In: BROWN, D. (Ed.). Career choice and development: Applying contemporary theories to practice. 4. ed. San Francisco: Jossey-Bass, 2002. p. 255–311.
STAJKOVIC, A. D.; LUTHANS, F. Self-efficacy and work-related performance: A meta-analysis. Psychological Bulletin, v. 124, n. 2, p. 240–261, 1998